a névoa que somos nós
Revisitar dias antigos é sacudir teias de aranha a palavras que foram ditas,
desempoeirar olhares trocados há tanto tempo.
Tanto tempo que nesses dias se dava corda aos relógios.
Marcamos o pó do chão com os nossos passos.
Somos espectros de outras noites, do que fomos e ali jurámos ser... e não cumprimos.
Como se estas paredes fossem o grito de uma intenção, um amor largado a meio.
Paramos e sabemos que temos duas escolhas à saída: de um lado o sol, do outro a névoa.
Foi só o que permaneceu do velho Hotel, a opção de escolher luz ou sombra, sol ou chuva, separadas por uma curva.
É assim, aquela curva que abraça o Monte Palace... uma metáfora da vida.
Olhamos um para o outro. E sem palavras, saímos para o nevoeiro, como sempre... a escolha que nos mostra porque estamos juntos.
É a paixão de entrar pelas névoas.
De rasgar o lado mais negro um do outro, a loucura de dar as mãos nas brumas sem saber onde terminam.
Estas paredes são, afinal, mais que repositório de memórias; são a marca da vitória na luta que travámos para sermos nós próprios.
foto: Hotel Monte Palace, São Miguel, 2017